Carta do Câmpus Matão à reitoria e aos demais Câmpus


Os servidores do campus Matão vêm, por meio dessa carta, se manifestar sobre a Instrução Normativa 08/2022, do IFSP, que discorre sobre o procedimento padrão para registro de ponto para servidores, instituindo o ponto eletrônico para os docentes e modificando as regras para os TAES.

Todavia, o documento não foi sequer discutido com a comunidade envolvida, representada por: docentes e servidores técnico administrativos, dirigentes das instituições da Rede Federal e entidades sindicais. Dessa forma, não foi respeitado o trâmite democrático, previsto por lei e preconizado pela Constituição Federal de 1988.

O Campus Matão iniciou os debates sobre a resolução 983 e sobre ponto eletrônico em 2020, tão logo ela foi apresentada, também realizou discussões com a CEAD e com membros do sindicato (SINASEFE-SP). Como resultado dos debates e reuniões realizados, foi proposta uma nota pública expressando o pedido dos servidores do Campus Matão, aprovada pelo CONCAM.

Neste documento, ressaltamos que a natureza do trabalho docente é intelectual, multifacetada e com características que se associam com a flexibilidade na composição de suas atividades, distribuídas no tripé ensino-pesquisa-extensão, além da gestão e capacitação. O trabalho dos técnicos administrativos (TAEs) é de natureza educacional e fundamental para prover toda a estrutura para que os processos de ensino e aprendizagem se desenvolvam adequadamente, com frentes de atuação em diversas áreas, com características peculiares e com especificidades de natureza pedagógico-administrativa. Ressalta-se, portanto, que as naturezas dos trabalhos educativos são distintas dos demais trabalhadores, especialmente dos fabris, cujo controle se faz por meio de ponto eletrônico.

O IFSP é uma instituição que preconiza a educação de qualidade, atendendo a uma população com considerável grau de vulnerabilidade econômica, social e funcional. Por esse motivo, após ampla discussão entre os servidores, foi decidido que os docentes passariam a ter suas atividades controladas por meio de outras formas, que não o ponto eletrônico, a saber: o planejamento (PIT) e relatórios de atividades (RITs), realizados semestralmente e registrados após aprovação da CAAD no SUAP, plataforma digital, com acesso público e livre para qualquer servidor ou estudante cadastrado no sistema. Esse planejamento inclui as 40h de atividades docentes, além dos horários de aula, de atendimento aos estudantes e de Reuniões Pedagógicas e,  vale destacar que o RIT de um docente contém frequentemente atividades divididas em frações de horas, sendo muito comum que o documento não contenha TODAS as atividades realizadas, pois uma carga horária de um trabalho dessa natureza, se somada integralmente, ultrapassaria as 40 horas semanais, para que foram concursados. Questiona-se aqui, se uma vez instaurado o ponto eletrônico, os docentes receberão horas extras pela realização e registro de seus trabalhos integrais. Caminho perigoso, pouco produtivo, de retrabalho (uma vez que o planejamento já está registrado no sistema), que gerará mais descontentamento com a instituição.

A despeito da regulamentação do trabalho remoto e da jornada de 30 horas dos TAEs, se faz necessária uma análise dos trabalhos desenvolvidos nos diversos setores que atuam, inclusive para avaliar a necessidade de registros ou de sua forma de apontamento, uma vez que a natureza desse trabalho é orientada por objetivos e acompanhado pela gestão, no que se refere ao desempenho e cumprimento de atividades. Além disso, como servidores de uma instituição de educação, ciência e de tecnologia, também podem realizar trabalhos na área de ensino, pesquisa e extensão. Está em curso a implantação de um processo retrógrado de registro de jornada, que inclui duplicidade de controles, para o qual se questiona a eficácia sobre a produtividade e a melhoria que se poderia promover com a adoção de tal medida. Questiona-se também o volume de dados de apontamentos que se associam apenas a registros burocráticos de atividades, tomando tempo desnecessário de servidores para operacionalização de um sistema que não traz ganhos à instituição.

A Legislação Brasileira discorre acerca da previsão legal da dispensa de ponto e da aplicação do Princípio Constitucional da Igualdade aos ocupantes de cargos de Professor EBTT e Magistério Superior:

- A Instrução Normativa 08/2022, do IFSP não se encontra em consonância jurídica com ordenações de maior hierarquia, como a Constituição Federal de 1988, que traz, em seu Art. 207, § 2º, in verbis, que: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. (...) § 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e tecnológica”. (grifo nosso)

-O Decreto 1590/95, que dispõe sobre a jornada de trabalho dos servidores da Administração Pública Federal, prevê de forma expressa em seu art. 7º, “e” que os ocupantes do cargo de Professor da Carreira de Magistério Superior estão dispensados do controle de frequência. Além disso, a Carreira de Professor EBTT, em seu próprio nome traz que são professores do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico. Além de cursos Tecnológicos serem cursos superiores, os docentes também podem atuar em cursos de Bacharelado e de Licenciatura, existentes em seus campi.

-Os pareceres nº 47/2013/DEPCONSU/PGF/AGU e nº 047/2015/CONSUL/PFIFSÃOPAULO/PGF/AGU expressam esse entendimento em respeito ao princípio constitucional basilar da igualdade, pois a própria Lei nº 11.784/08, que criou a Carreira de Magistério do EBTT, bem como a Lei nº 12.772/12 que a reformou, estabeleceram atribuições iguais de ensino, pesquisa e extensão dos professores do Magistério Superior aos professores EBTT, além de equiparar suas carreiras, conforme se verifica na sequência. “São atividades das Carreiras e Cargos Isolados do Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal aquelas relacionadas ao ensino, pesquisa e extensão...” (art. 2º, “caput” da Lei nº 12.772/12) e seu art. 3º “caput” estabelece a equiparação de carreiras “

-Desde 1º de março de 2013, a Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico e o Cargo Isolado de Professor Titular do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, de que tratam os incisos I e II do caput do art. 106 da Lei nº 11.784, de 2008, passaram a pertencer ao Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal. Se ambas as carreiras possuem as mesmas atribuições (ensino, pesquisa e extensão – termos expressos nos documentos internos do IFSP que versam sobre o processo de ensino e aprendizagem) e se ambas as carreiras estão equiparadas, a medida de controlar os docentes EBTT por meio de ponto eletrônico é um flagrante desrespeito ao princípio constitucional da igualdade e demais legislações acima citadas estabelecer controle de jornada diferenciado por meio de normativa infralegal, como é o caso da Nota Técnica SEI nº 28499/2020.

- O controle da atividade docente, por meio de PIT e RIT, antes da publicação da Nota Técnica SEI nº 28499/2020 editada pelo atual Ministério da Economia, era praticado e realizado, ano após ano sem que se registrasse qualquer prejuízo à prestação do serviço público docente, haja vista a natureza do trabalho educacional acima exposta, inerente ao trabalho de todos os servidores inseridos no contexto escolar. Tampouco foram reportados prejuízos do sistema de controle que já existe no atendimento de servidores técnico-administrativos.

-Questiona-se aqui a validade jurídica da Nota Técnica SEI nº 28499/2020 editada pelo atual Ministério da Economia, pois o IFSP é regulamentado pelo Ministério da Educação – MEC. Acredita-se oportuno registrar que a atual Reitoria do IFSP não levou em consideração a deliberação do CONSUP (Conselho Superior), mas que, em consonância com o PARECER 01213/2021/CONSUL/PFIFSÃO PAULO/PGF/AGU ao mencionar a decisão do Supremo Tribunal Federal em Ação Direta de Inconstitucionalidade, após citar o art. 14, §4º da Lei. 12.772/12, que trata das diretrizes gerais para o processo de avaliação de desempenho da carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, “§ 4º As diretrizes gerais para o processo de avaliação de desempenho para fins de progressão e de promoção serão estabelecidas em ato do Ministério da Educação e do Ministério da Defesa, conforme a subordinação ou vinculação das respectivas IFE e deverão contemplar as atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão, cabendo aos conselhos competentes no âmbito de cada Instituição Federal de Ensino regulamentar os procedimentos do referido processo.” e conclui que: “Assim, a regulamentação interna das atividades de ensino, pesquisa, extensão e gestão é da competência do Conselho Superior do IFSP, e deve ser elaborada conforme as diretrizes estabelecidas pelo Ministério da Educação - MEC (STF, ADI 51-9).”

-O ponto eletrônico não ocorre na maioria dos Institutos Federais.

Considerando o exposto, aliado ao fato de que até o presente momento, o ordenamento jurídico não ter tido qualquer alteração que justifique a alteração no controle de presença, reforçada a medida não traz ganhos pedagógicos, muito menos científicos ou administrativos ao IFSP, solicitamos que a Reitoria não realize o cadastro eletrônico (biometria) de seus servidores e que revogue a IN 08/2022-IFSP com ampla discussão com a comunidade envolvida na questão, com base nos princípios norteadores de autonomia administrativa e gestão democrática, preconizados na Constituição Federal.